terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Gene que controla rins está ligado à insuficiência cardíaca, diz estudo


Cientistas de instituições norte-americanas identificaram pela primeira vez uma variante de sequência de DNA que não apenas está associada ao aumento do risco de insuficiência cardíaca como parece ter um papel central entre suas causas.

A variante – uma mudança em uma única “letra” da sequência genética –, comum na população, prejudica canais que controlam o funcionamento dos rins. O trabalho será publicado esta semana pela revista Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS).

De acordo com um dos autores da pesquisa, Gerald Dorn II, professor da Faculdade de Medicina da Universidade Washington em Saint Louis, não se trata de um gene do coração e sim do rim.

“Essa proteína não é nem mesmo expressa no coração. Ninguém havia imaginado que esse defeito em um gene específico do rim pudesse predispor o paciente à insuficiência cardíaca”, disse Dorn.

A insuficiência cardíaca é diagnosticada quando o coração não pode mais fornecer sangue suficiente para o corpo e pode ter diversas causas, incluindo alta pressão sanguínea, terapia contra o câncer, infecções virais do coração e ataque cardíaco.

“Trata-se de uma síndrome. O dano no coração do paciente é suficiente para que ele não funcione muito bem. O paciente então acumula fluido nos pulmões, sofre com inchaço e tem problemas para respirar”, explicou Dorn.

Os resultados inesperados destacam as vantagens da realização de estudos genômicos em larga escala com a finalidade de descobrir variantes de sequências de DNA associadas a doenças.

“Foi um achado surpreendente. Trata-se de um bom exemplo de como é possível conseguir objetivos inesperados quando se parte de abordagens imparciais para estudar doenças humanas”, disse Thomas Cappola, professor da Faculdade de Medicina da Universidade de Pensilvânia e outro autor do estudo.

Em um trabalho anterior, Dorn e equipe utilizaram uma técnica de pesquisa parcial do genoma para definir a região do DNA na qual as mudanças em sequências estavam associadas com a insuficiência cardíaca.

Mas a maior parte dessas mudanças em sequências não codificava para mudanças em proteínas e parecia não causar aumento no risco. Apesar disso, elas serviram como marcadores, fornecendo pistas de que essa parte do genoma merecia uma análise mais acurada.

“Concluímos que tínhamos o CEP certo, mas estávamos na quadra errada”, disse Dorn. Os cientistas então sequenciaram os genes vizinhos, buscando variações em partes da sequência de DNA que codificava para proteínas.

Estudando três grupos de pacientes caucasianos com insiuficiência cardíaca, eles descobriram uma variante de sequência de DNA que era comum aos três grupos e que estava ativamente envolvida na construção de uma proteína importante para o organismo.

Uma mudança única em uma sequência de DNA de um gene chamado CLCNKA desencadeia uma mudança de arginina para glicina no 83º aminoácido da proteína. Essa proteína faz parte de um canal do rim responsável por controlar a secreção de íons cloreto na urina – um importante processo na manutenção do balanço adequado de sal e água no organismo.

Aquela mudança isolada em um aminoácido reduzia pela metade a capacidade do canal de transportar íons cloreto através da membrana celular. A hipótese dos cientistas é que o resultado dessa redução pode ser a elevação, no sangue, dos níveis do hormônio conhecido como renina.

Testes com bloqueador

A renina é produzida no rim e é o primeiro sinal de um efeito em cascata que pode causar danos ao coração. Isso abre a possibilidade de ajudar pessoas que possuem a variante a reduzir seu risco de insuficiência cardíaca com drogas normalmente utilizadas para tratar a hipertensão, incluindo os inibidores do ACE (Enzima de Conversão da Angiotensina, na sigla em inglês e os bloqueadores de aldosterona.

Para determinar a efetividade dessa abordagem, Dorn e colegas projetaram um teste clínico que será aplicado nas universidades de Washington e da Pensilvânia e que testará se os efeitos do gene de risco podem ser combatidos por um bloqueador de aldosterona. Se for possível, a descoberta abre as portas para uma terapia preventiva personalizada com base no genótipo dos indivíduos.

Durante a vida, as pessoas têm em média uma chance em cinco de desenvolver insuficiência cardíaca. Para indivíduos com uma cópia da variante da sequência genética, esse risco pode crescer 27%. Para os que possuem duas cópias da variante – uma do pai e outra da mãe – o risco de desenvolver insuficiência cardíaca pode aumentar em 54%. Cerca de um quarto dos caucasianos têm duas cópias da variante genética.

Ter as duas cópias, no entanto, não é razão suficiente para causar a insuficiência cardíaca, segundo Dorn. “Há muita gente andando por aí com essa variante e sem nenhum sinal de insuficiência cardíaca. Mas achamos que se um paciente tem essa predisposição e acontecer algo mais a ele – como desenvolver uma hipertensão, ou ter um pequeno infarto – isso aumentará em muito as chances de ter a insuficiência cardíaca”, disse.

Agência Fapesp