Tor D. Wager, professor de psicologia da Universidade do Colorado e pesquisador do efeito placebo
A expressão “ligação mente-corpo” possui muitas conotações. Para alguns, é uma indicação de charlatanismo da Nova Era. Para outros, é uma fonte de esperança e uma maneira de reconciliar sua vida espiritual com a ciência moderna. Para o Dr. Tor D. Wager, é apenas mais um dia no escritório.
Wager é professor de psicologia na Universidade do Colorado. Sua especialidade é a neurociência e a neuroimagem, mas sua paixão é o efeito placebo – fenômeno que apresentou uma ressurreição nos últimos anos e está sendo estudado por pesquisadores de muitos lados da ciência.
Grande parte dessa atenção é um resultado do tipo de imagens do cérebro que Wager faz, e ele é uma figura principal na nova geração de pesquisadores sobre o placebo.
E isso pode fazer seu histórico parecer improvável. Wager, de 35 anos, foi criado na ciência cristã, religião bastante conhecida por sua aversão ao tratamento médico. Porém, sua família não era rígida em relação a isso; ele se recorda de um incidente de sua infância, no Colorado, que poderia servir como um arauto de sua carreira.
Experiência pessoal
Ainda bebê, ele teve uma irritação, e depois de muita reza sua mãe o levou a um médico, temendo a febre escarlate. “O médico disse: ‘Aqui está um creme, espalhe no local’, e a irritação foi embora”, contou Wager.
Junto com ela foi a agonia de sua mãe. Seu pulso provavelmente desacelerou, ele diz hoje, e sua respiração relaxou – exatamente o efeito que um placebo pode ter num paciente aterrorizado.
De modo progressivo, o efeito placebo tem sido visto como real e tangível, além de misterioso. Em diversas pesquisas, de 45% a 85% dos médicos americanos e europeus afirmam ter usado placebos na prática clínica, e 96% dos médicos acadêmicos nos Estados Unidos dizem achar que o placebo possui efeitos terapêuticos.
Mesmo assim, muitos desconfiam dele. “Quando comecei a faculdade, senti que estudar o placebo era um tipo de tabu”, disse Wager. Na época, a pesquisa era no máximo pontual, “e havia partes inteiras da sociedade que estavam prontas para abordar o assunto e dizer: ‘Vejam como a mente é poderosa!’”
Mas a pesquisa sobre o placebo ganhou respeitabilidade nos últimos anos, em grande parte pelo trabalho do Dr. Fabrizio Benedetti, neurocientista italiano considerado por muitos o patriarca do campo. Benedetti argumenta que não existe apenas um efeito placebo, mas muitos.
Um efeito comum envolve a suposição de que uma pílula em particular é responsável por suavizar a dor ou o desconforto que está, na verdade, diminuindo naturalmente. Outro é o clássico condicionamento pavloviano, onde o paciente está tão acostumado a se sentir melhor após uma injeção que ela funciona independente de seu conteúdo. Outro é o alívio que o paciente experimenta quando o médico oferece uma solução concreta – como ocorreu com a mãe de Wager.
Como aluno de graduação na Universidade de Michigan, Wager usava imagens para observar emoções no cérebro. Era um trabalho fascinante, diz ele, mas as emoções são difíceis de definir com precisão, e ele queria fazer algo que pudesse ajudar os pacientes.
Assim, ele decidiu examinar placebos num ambiente clínico. Em 2001, se uniu ao Dr. Robert M. Rose, cientista da Universidade do Texas que havia realizado estudos pioneiros sobre o stress em veteranos da guerra do Vietnã, e um grupo de respeitados pesquisadores criou a Rede de Interações Mente-Corpo.
Ressonância magnética
Em alguns anos, o nome de Wager estava no topo de um estudo revolucionário na revista “Science”, que usava imagens funcionais de ressonância magnética (RM) – um exame especializado que mede alterações no fluxo sanguíneo – para ligar ativações específicas do cérebro a pessoas experimentando o efeito placebo (neste caso, espalhando um creme sem efeito numa queimadura). Desde então, ele escreveu aproximadamente uma dúzia de artigos sobre os efeitos do placebo, incluindo um estudo de 2007 ligando os efeitos relacionados à dor com partes do cérebro que processam ópio ou heroína (o que pode ajudar a explicar por que muitos placebos são temporários).
“Tor é daquelas pessoas que precisam convencer a si mesmas”, explicou Rose. “Ele não compra uma ideia porque alguém a comprou. Ele é cético. Mas, uma vez que a compra, aí ele se torna um teimoso”.
Quando Wager não está escrevendo sobre placebos, ele defende as ferramentas que usa para estudá-los. Muitos críticos são céticos a respeito da RM funcional, e Wager diz que inicialmente também era.
Para lidar com esse ceticismo, segundo ele, uma pessoa pode “a) dizer ‘Isso tudo é um pouco falso, vamos tentar outra coisa’, ou b) tentar trabalhar e desenvolver coisas que tornem o assunto mais plausível”.
Na recente conferência da Organização para o Mapeamento do Cérebro Humano, Wager fez uma apresentação sobre placebos a uma plateia lotada de cientistas. Mas seu laboratório, na Universidade do Colorado, também divulgou misteriosas estatísticas sobre a leitura de imagens cerebrais. Tal atenção a detalhes, disse ele, é a única maneira de convencer os céticos.
Até recentemente, o governo e a indústria farmacêutica estavam hesitantes em financiar estudos sobre os efeitos do placebo.
“Empresas que estão desenvolvendo novos tratamentos gostam de pensar que seus remédios funcionam melhor do que o simples pensamento positivo”, afirmou a Dra. Helen S. Mayberg, neurologista da Universidade Emory conhecida por seu trabalho com RM funcional em pacientes com depressão (ela rapidamente acrescentou que os efeitos do placebo são muito diferentes do pensamento positivo).
Algumas vezes, experimentos de novos remédios começam com todos os participantes tomando placebos; os que melhoram são excluídos. Mesmo fortalecendo os resultados, isso não ajuda os pesquisadores a compreender por que as pessoas do primeiro grupo melhoraram.
Por que funciona mais para alguns?
A pergunta persistente – por que algumas pessoas respondem mais a placebos do que outras – frustra cientistas há muito tempo. “Existem décadas de pesquisas que basicamente fracassaram”, disse Wager. “Novos métodos nos deixarão obter muito mais informações a partir disso”.
Solucionar o mistério poderia potencialmente abrir novas áreas para terapia. O Dr. Wager compareceu, recentemente, a um encontro patrocinado pelo Instituto Nacional de Saúde (NIH, da sigla em inglês) buscando unir diversas instituições num esforço para entender os placebos. Várias empresas farmacêuticas estavam presentes; algumas já haviam iniciado seus próprios estudos sobre o mistério.
Wager (que recebe financiamento do NIH, da Fundação Nacional de Ciência e da Fundação Michael J. Fox), diz que as empresas de remédios não queriam atrair atenção demais para os placebos, mas reconheciam um potencial para tratamentos melhores.
Para ele, entretanto, a questão é mais profunda, ligada à religião de sua infância e à forma como vê o mundo. “O que é o efeito placebo?”, perguntou ele. “Não é algo mágico e estranho que simplesmente acontece do nada”.
“Eu acho que ele está ligado aos sistemas que geram reações emocionais”, continuou. “É uma janela para caminhos onde os fatores psicológicos podem afetar fatores do cérebro e do corpo que sejam relacionados à saúde”.
Wager é professor de psicologia na Universidade do Colorado. Sua especialidade é a neurociência e a neuroimagem, mas sua paixão é o efeito placebo – fenômeno que apresentou uma ressurreição nos últimos anos e está sendo estudado por pesquisadores de muitos lados da ciência.
Grande parte dessa atenção é um resultado do tipo de imagens do cérebro que Wager faz, e ele é uma figura principal na nova geração de pesquisadores sobre o placebo.
E isso pode fazer seu histórico parecer improvável. Wager, de 35 anos, foi criado na ciência cristã, religião bastante conhecida por sua aversão ao tratamento médico. Porém, sua família não era rígida em relação a isso; ele se recorda de um incidente de sua infância, no Colorado, que poderia servir como um arauto de sua carreira.
Experiência pessoal
Ainda bebê, ele teve uma irritação, e depois de muita reza sua mãe o levou a um médico, temendo a febre escarlate. “O médico disse: ‘Aqui está um creme, espalhe no local’, e a irritação foi embora”, contou Wager.
Junto com ela foi a agonia de sua mãe. Seu pulso provavelmente desacelerou, ele diz hoje, e sua respiração relaxou – exatamente o efeito que um placebo pode ter num paciente aterrorizado.
De modo progressivo, o efeito placebo tem sido visto como real e tangível, além de misterioso. Em diversas pesquisas, de 45% a 85% dos médicos americanos e europeus afirmam ter usado placebos na prática clínica, e 96% dos médicos acadêmicos nos Estados Unidos dizem achar que o placebo possui efeitos terapêuticos.
Mesmo assim, muitos desconfiam dele. “Quando comecei a faculdade, senti que estudar o placebo era um tipo de tabu”, disse Wager. Na época, a pesquisa era no máximo pontual, “e havia partes inteiras da sociedade que estavam prontas para abordar o assunto e dizer: ‘Vejam como a mente é poderosa!’”
Mas a pesquisa sobre o placebo ganhou respeitabilidade nos últimos anos, em grande parte pelo trabalho do Dr. Fabrizio Benedetti, neurocientista italiano considerado por muitos o patriarca do campo. Benedetti argumenta que não existe apenas um efeito placebo, mas muitos.
Um efeito comum envolve a suposição de que uma pílula em particular é responsável por suavizar a dor ou o desconforto que está, na verdade, diminuindo naturalmente. Outro é o clássico condicionamento pavloviano, onde o paciente está tão acostumado a se sentir melhor após uma injeção que ela funciona independente de seu conteúdo. Outro é o alívio que o paciente experimenta quando o médico oferece uma solução concreta – como ocorreu com a mãe de Wager.
Como aluno de graduação na Universidade de Michigan, Wager usava imagens para observar emoções no cérebro. Era um trabalho fascinante, diz ele, mas as emoções são difíceis de definir com precisão, e ele queria fazer algo que pudesse ajudar os pacientes.
Assim, ele decidiu examinar placebos num ambiente clínico. Em 2001, se uniu ao Dr. Robert M. Rose, cientista da Universidade do Texas que havia realizado estudos pioneiros sobre o stress em veteranos da guerra do Vietnã, e um grupo de respeitados pesquisadores criou a Rede de Interações Mente-Corpo.
Ressonância magnética
Em alguns anos, o nome de Wager estava no topo de um estudo revolucionário na revista “Science”, que usava imagens funcionais de ressonância magnética (RM) – um exame especializado que mede alterações no fluxo sanguíneo – para ligar ativações específicas do cérebro a pessoas experimentando o efeito placebo (neste caso, espalhando um creme sem efeito numa queimadura). Desde então, ele escreveu aproximadamente uma dúzia de artigos sobre os efeitos do placebo, incluindo um estudo de 2007 ligando os efeitos relacionados à dor com partes do cérebro que processam ópio ou heroína (o que pode ajudar a explicar por que muitos placebos são temporários).
“Tor é daquelas pessoas que precisam convencer a si mesmas”, explicou Rose. “Ele não compra uma ideia porque alguém a comprou. Ele é cético. Mas, uma vez que a compra, aí ele se torna um teimoso”.
Quando Wager não está escrevendo sobre placebos, ele defende as ferramentas que usa para estudá-los. Muitos críticos são céticos a respeito da RM funcional, e Wager diz que inicialmente também era.
Para lidar com esse ceticismo, segundo ele, uma pessoa pode “a) dizer ‘Isso tudo é um pouco falso, vamos tentar outra coisa’, ou b) tentar trabalhar e desenvolver coisas que tornem o assunto mais plausível”.
Na recente conferência da Organização para o Mapeamento do Cérebro Humano, Wager fez uma apresentação sobre placebos a uma plateia lotada de cientistas. Mas seu laboratório, na Universidade do Colorado, também divulgou misteriosas estatísticas sobre a leitura de imagens cerebrais. Tal atenção a detalhes, disse ele, é a única maneira de convencer os céticos.
Até recentemente, o governo e a indústria farmacêutica estavam hesitantes em financiar estudos sobre os efeitos do placebo.
“Empresas que estão desenvolvendo novos tratamentos gostam de pensar que seus remédios funcionam melhor do que o simples pensamento positivo”, afirmou a Dra. Helen S. Mayberg, neurologista da Universidade Emory conhecida por seu trabalho com RM funcional em pacientes com depressão (ela rapidamente acrescentou que os efeitos do placebo são muito diferentes do pensamento positivo).
Algumas vezes, experimentos de novos remédios começam com todos os participantes tomando placebos; os que melhoram são excluídos. Mesmo fortalecendo os resultados, isso não ajuda os pesquisadores a compreender por que as pessoas do primeiro grupo melhoraram.
Por que funciona mais para alguns?
A pergunta persistente – por que algumas pessoas respondem mais a placebos do que outras – frustra cientistas há muito tempo. “Existem décadas de pesquisas que basicamente fracassaram”, disse Wager. “Novos métodos nos deixarão obter muito mais informações a partir disso”.
Solucionar o mistério poderia potencialmente abrir novas áreas para terapia. O Dr. Wager compareceu, recentemente, a um encontro patrocinado pelo Instituto Nacional de Saúde (NIH, da sigla em inglês) buscando unir diversas instituições num esforço para entender os placebos. Várias empresas farmacêuticas estavam presentes; algumas já haviam iniciado seus próprios estudos sobre o mistério.
Wager (que recebe financiamento do NIH, da Fundação Nacional de Ciência e da Fundação Michael J. Fox), diz que as empresas de remédios não queriam atrair atenção demais para os placebos, mas reconheciam um potencial para tratamentos melhores.
Para ele, entretanto, a questão é mais profunda, ligada à religião de sua infância e à forma como vê o mundo. “O que é o efeito placebo?”, perguntou ele. “Não é algo mágico e estranho que simplesmente acontece do nada”.
“Eu acho que ele está ligado aos sistemas que geram reações emocionais”, continuou. “É uma janela para caminhos onde os fatores psicológicos podem afetar fatores do cérebro e do corpo que sejam relacionados à saúde”.
Por Erik Vance