Na varanda do Welcome, Carlinhos 70 posa com o pôr do sol na Baía de Guanabara ao fundo
Em um dos pontos mais altos do Morro da Providência, no Centro do Rio de Janeiro, de onde se tem uma vista privilegiada da Baía de Guanabara e da Zona Portuária, fica o bar Welcome. O dono, bastante conhecido na favela, prefere não revelar o nome, mas apenas a alcunha pelo qual ficou conhecido: “Carlinhos 70!” Mas por quê? “É por causa do ano em que nasci: 1971!"
Na série sobre formalização nas favelas, o G1 vai contar as histórias de empreendedores nas comunidades pacificadas do Rio de Janeiro.
Depois da pacificação, em março do ano passado, o Welcome tornou-se um dos locais mais frequentados por gente de fora do Morro da Providência - da Zona Sul carioca, inclusive -, que vai curtir as festas de sexta-feira e o visual panorâmico lá de cima. “As pessoas se sentem mais seguras para subir. A festa ficou mais cheia, e tive divulgação até do poder público”, conta Carlinhos.
Carlinhos 70 é empreendedor desde criança: aos 7 anos de idade, vendia doces do Dia de Cosme e Damião. “O comércio está no sangue. É um dom que Deus me deu”, ressalta. Aos 12 anos, começou a vender alho e limão em uma feira-livre. Aos 21, após uma temporada na Paraíba com a família, se tornou sacoleiro. “Eu comprava no Paraguai e revendia em três barracas espalhadas pela cidade: na Praça Saens Peña, na Uruguaiana e na Central do Brasil. Cheguei a ter três funcionários”, conta. Paralelamente, Carlinhos vendia óculos de sol e biscoito nas praias cariocas.
“Nunca gostei de trabalhar com carteira assinada para ninguém. O salário-mínimo do Brasil é para miserável. Não paga nem o que meu neto gasta por mês”, critica Carlinhos 70. Os dois negócios acabaram por conta de fiscalização. “Na estrada, fui pego pela polícia com uma quantidade de mercadoria acima da cota permitida. Na praia, desisti de trabalhar depois que a prefeitura colocou mais guardas na areia”, conta.
Em 2000, com 29 anos, ele montou o Welcome, que só foi formalizado dez anos depois, em novembro de 2010. “Eu sempre quis trabalhar legalmente, mas nunca deram oportunidade, ou a devida atenção. Eu nunca paguei água, nem luz. A gente não era gente. Eles não nos viam como seres humanos, mas como favelados. Só que favelado também é gente”, desabafa Carlinhos, reclamando da ausência do poder público na comunidade por anos a fio.
Agora, com os projetos que estão sendo feitos na comunidade, Carlinhos 70 já pode planejar o futuro. “O Sebrae veio à favela e trouxe a oportunidade para a gente se formalizar. Em cima do bar, quero construir sete quartinhos para receber gringos”, detalha ele.
Por Bernardo Tabak – Do PEGN