sexta-feira, 20 de maio de 2011

Quem inventou o cachorro vegetariano?


A moda de negar carne a animais carnívoros mostra que a humanização (cada vez maior) dos bichos domésticos não tem limites – e pode prejudicá-los


Cachorros e homens vivem juntos há pelo menos 12 mil anos, numa relação contínua que se revelou benéfica para as duas espécies. Sem a proteção do homem, dificilmente o cão teria chegado aos dias atuais. Não era um predador de sucesso. Mas revelou-se brilhante no poder de transmitir conforto e confiança aos seres humanos – e de acompanhar as mudanças de seus hábitos e valores. O bicho ganhou um papel afetivo que antes era desempenhado por parentes e vizinhos. Agora, o poder de adaptação dos cachorros está novamente em teste. Pessoas que não querem comer carne – por implicar a morte de um outro ser vivo – estão impondo a seus cães domésticos dietas vegetarianas ou veganas, ainda mais radicais. Os veganos não comem nenhuma espécie de proteína de origem animal, como leite. Aplicar esses valores aos animais de estimação representa, para muitos, uma manifestação de respeito. Mas obrigar cães e gatos a viver de vegetais e passar o dia sozinhos dentro de apartamentos representa uma prova de carinho?

A treinadora de animais Ana Aleirbag, de 22 anos, não come um único pedaço de carne desde 2007. Nem ela nem seus seis cães. Ana estendeu aos bichos de estimação a dieta vegetariana que adotou para si mesma, na mesma época. “Era incoerente eu não comer carne e dar uma ração com restos de cadáveres para minha melhor amiga”, diz, referindo-se a Fly, uma cadela da raça border collie de 5 anos. “Consultei o veterinário, planejei a transição alimentar e nenhum deles estranhou a mudança.” Eles obviamente não teriam meios de se queixar, mas é provável que adoecessem se a troca de dieta fosse muito nociva. Ana serve uma porção de ração vegetariana misturada a frutas. Em horário alternado, dá leite de vaca, iogurtes e queijo branco – fontes de cálcio e proteína animal.

O desenvolvedor de software curitibano Anderson dos Santos, de 27 anos, foi além. Impôs a sua vira-lata Cindy uma alimentação vegana – ou seja, inteiramente à base de vegetais, sem nenhuma proteína de origem animal. “Não tinha cabimento causar sofrimento a um bicho para alimentar outro”, diz Santos. Isso foi há cinco anos. Hoje tem outros dois cães veganos. Para propagar a filosofia, traduziu para o português o livro Cães veganos: nutrição com compaixão, do veterinário e pesquisador James O’Heare. “Hoje, eu mesmo fabrico a ração caseira com suplementos de cálcio, vitamina B12 e zinco”, afirma Santos. O mais famoso cão vegano do mundo foi a cadela Bramble. Quando morreu, em 2003, ela somava 27 anos e 11 meses de vida – o terceiro cão mais longevo registrado pelo Guinness book. Alimentava-se de uma pasta com arroz integral, lentilhas e vegetais orgânicos. Sua dona, a inglesa Anne Heritage, de 52 anos, é vegana radi-cal. “Ela viveu feliz”, disse na ocasião da morte.


Rodrigo Turrer, Humberto Maia Junior e Marcelo Moura - Do Época