terça-feira, 29 de março de 2011

Reportagem Crianças aprendem empreendedorismo com desenhos

De desenhos como os destas páginas, crianças de escolas públicas aprendem empreendedorismo e criam produtos como um celular a energia solar e um programa que faz desse aparelho um controle remoto para computador

Por Rodolfo Araújo
Marcos Camargo
RETRATOS DA VIDA > Durante o programa Pedagogia Empreendedora, são realizadas dinâmicas lúdicas para atiçar a imaginação das crianças. Em uma delas, os professores pedem que os alunos desenhem um autorretrato: o objetivo é estimular o autoconhecimento. Outra atividade é o Mapa da Vida. A ideia é que os estudantes tracem a trajetória que imaginam para si mesmos, desenhando seus objetivos e as maneiras de consegui-los

João Paulo Fernandes, Wesley Lima e Gabriel Sampaio, todos com 15 anos, tinham um sonho: montar uma empresa que produzisse aparelhos eletrônicos, mas que também adotasse o conceito da sustentabilidade. Dedicaram-se a pesquisas, fizeram cursos técnicos, investiram em equipamento e criaram um produto inovador: o Solular, uma bateria que carrega aparelhos móveis somente com a energia do sol.

Os três amigos não fazem parte de nenhuma startup de tecnologia. Na verdade, Fernandes, Lima e Sampaio, assim como os outros dez “sócios” da empresa fictícia, são alunos da escola municipal Professora Aurea Cantinho Rodrigues, em São José dos Campos (SP). O projeto em questão, o Solular, foi o campeão da Feira do Jovem Empreendedor, evento realizado no mês de outubro, reunindo trabalhos de estudantes da rede pública do município.

Marcos Camargo
O método criado pelo professor e escritor mineiro Fernando Dolabela atinge 400 mil alunos de 126 cidades brasileiras

A escola Professora Aurea Cantinho Rodrigues é um dos dois mil estabelecimentos de ensino onde foi implantado o método da Pedagogia Empreendedora. Idealizado pelo escritor e professor mineiro Fernando Dolabela, o programa contempla, atualmente, 400 mil alunos matriculados na educação infantil e no ensino médio das redes públicas municipais de 126 cidades brasileiras.

Dolabela começou a desenvolver o conceito há 20 anos, durante sua carreira de professor universitário — ele lecionou na UFMG e atualmente dá aulas na Fundação Dom Cabral. Na época, criou a Oficina do Empreendedor, que visava capacitar alunos do ensino superior a abrirem seus próprios negócios. Não deu certo: segundo ele, os jovens estudantes tinham um modo de pensar cristalizado, que tornava difícil uma mudança de valores. “Quanto mais eu me aprofundava no tema, mais percebia que o melhor momento para provocar alterações mais fortes seria a infância, quando a criança está sendo aculturada.” Decidido a voltar sua atenção para o universo infantil, Dolabela formou uma equipe sem experiência em empreendedorismo, mas especializada em processos pedagógicos. Em quatro anos, a proposta do método estava concluída.

A princípio, o educador não tinha a rede pública como prioridade: seus primeiros contatos foram com as escolas particulares. “Pensei que seria fácil entrar nesses estabelecimentos, até porque os filhos dos empreendedores estão lá. Mas o setor privado não tem consciência de que deve contribuir para o desenvolvimento do país”, afirma. A decepção fez com que procurasse as prefeituras municipais. A partir daí, a Pedagogia Empreendedora ganhou outra dimensão — o objetivo não é atingir apenas o aluno, mas também a cidade onde o programa é implantado. “Acredito que seja possível ajudar a criar uma cultura empreendedora junto a toda a população”, diz Dolabela. Segundo ele, a capacitação de professores e alunos influencia famílias e comunidades, contribuindo para o desenvolvimento econômico do município.