segunda-feira, 28 de março de 2011

Compras virtuais, entregas virtuais



Os números exuberantes parecem mostrar que o setor atingiu a maturidade: em 2011, o comércio eletrônico brasileiro vai faturar R$ 20 bilhões, ou seja, um crescimento de 30% em relação ao ano anterior. Mas, embora as cifras evoluam em ritmo frenético, a estrutura patina. Em março, tive um gostinho dessa encruzilhada que as empresas vivem. Comprei um produto em um dos maiores portais do varejo on-line, certo de que essas credenciais bastariam para garantir uma compra segura.

Mas a partir daquele instante foi como se tivesse entrado em um bizarro universo paralelo, onde uma empresa digital do século 21 se comporta como um mamute burocrático kafkaniano. Confirmei minha compra e paguei à vista em débito direto da conta corrente. Pelo relatório do site, o sistema levou exatos 10 minutos para confirmar o pedido e transferir o dinheiro. O prazo de entrega era de até sete dias úteis. “Ok”, pensei, “é uma previsão conservadora, provavelmente devo receber antes mesmo do dia programado”.

Na data final, nada de encomenda. Acionei o atendimento ao consumidor via chat. Na conversa, a atendente só me disse que não tinha como fazer contato com a transportadora para saber qual a previsão correta de entrega. Pedi para falar com alguém que pudesse resolver. Ninguém podia. A pessoa do outro lado do teclado me pediu mais dois dias úteis para me passar informações. Fim do prazo e… nada! Havia deixado meu e-mail particular, meu celular, telefone residencial. Mas nenhum contato foi efetuado.

De novo, entrei no chat para falar com o SAC. O atendente repetiu a mesma ladainha sobre não poder nem fazer contato com a transportadora nem passar o nome da empresa e pediu outros dois dias úteis. Desconsolado, argumentei que, nesse caso, eu mesmo poderia ir até o depósito e retirar a mercadoria. Pagaria o combustível. Ou ainda, teria desembolsado de bom grado o custo do frete (pelo valor da compra o envio era “grátis”), se isso resultasse em um serviço de logística melhor. E, finalizei, “como não há solução, prefiro receber o dinheiro de volta e ir a uma loja física”. Afinal, poderia levar o que eu queria na hora, sem essa emoção de prazo-roleta russa.

O atendente me disse que não poderia cancelar o pedido. A única maneira seria esperar o produto chegar e recusar-me a recebê-lo! Apenas assim a empresa devolveria o dinheiro. Questionei o absurdo. Se minha reclamação era justamente devido a não entrega, porque eu mandaria minha compra de volta? O atendente não conseguiu apresentar nenhuma solução para o real problema, ou seja, quando, de verdade, iriam entregar, ou caso o prazo fosse inaceitável, retornar o valor já debitado da conta corrente. Em resposta, obtive a declaração (transcrita literalmente do chat): “uma empresa trabalha com processos, não é de acordo com solicitação do cliente”.

Resolvi fazer uma rápida pesquisa em páginas de reclamação. Deparei-me com um quadro assustador. Apenas no portal ReclameAqui, as estatísticas mostram dezenas de milhares de pessoas com problemas semelhantes. Alguns clientes do mesmo site no qual fiz a compra esperam há mais de três meses pelo produto. Nos rankings do serviço de defesa do consumidor, a lista de Empresas mais Reclamadas dos Últimos 12 Meses mostra que das cinco primeiras posições, três, incluindo a campeã, são de varejo virtual. Na relação de Empresas Mais Reclamadas nos Últimos 30 Dias, as duas primeiras posições do pódio pertencem aos portais de compras.

Desse episódio, podemos tirar lições importantes. Em primeiro lugar, o serviço de atendimento ao consumidor tem de ter treinamento e autonomia para resolver os problemas. Pelo menos, conseguir cobrar uma posição da empresa de transporte e, eventualmente, poder cancelar o pedido. Pelo que pude perceber por meio da leitura dos relatos e pela minha experiência recente, as lojas virtuais simplesmente entregam os produtos para as suas parceiras logísticas e acham que sua responsabilidade acaba por aí. Em plena era da informação total, é de se espantar que uma companhia digital não consiga rastrear pedidos com eficiência (saber, por exemplo, quanto tempo de fato um produto leva para chegar).

Ponto importante também é dimensionar a estrutura. Será que o crescimento não está acelerado demais? Sem capacidade de entregar de modo rápido e eficiente, muitas vezes, o melhor é nem vender. Do contrário, a empresa engana o consumidor. É preciso criar soluções (cobrar o frete e ampliar a rede de distribuição. Se a loja for honesta e explicar ao cliente a necessidade de assegurar a qualidade do serviço, ele, com certeza, vai entender) e até mesmo oferecer a possibilidade de a pessoa retirar por conta própria a compra.

Quanto a mim, estou (temporariamente) convertido ao varejo offline. Cheguei à conclusão que a vida é mais fácil quando a gente pode ir à loja, manusear, escolher, negociar descontos com o vendedor, pagar e levar a compra na hora para casa. Mesmo a suposta vantagem do comércio virtual de entregar na residência não faz sentido se há risco de nem receber ou de ser premiado com um mês de atraso. Acho que faz sentido apenas para cidades onde não existam marcas ofertadas na internet. Meu produto? Ainda estou à espera…